Mar negro - Parte III

| foto original: pixabay

Sinopse: Mar Negro é uma imersão em experiências multidimensionais, narrada de forma envolvente e alternada entre a primeira e a terceira pessoa. O protagonista é subitamente capturado pelo desconhecido e levado a atravessar os limites da realidade, explorando outras dimensões do universo. À medida que viaja entre esses mundos, sua compreensão humana de vida, morte e existência é desafiada e fragmentada, tornando cada vez mais difícil acessar os segredos ocultos no abismo do Mar Negro. Em cada nova jornada, ele descobre fragmentos de uma verdade maior e se depara com formas de existência que transcendem o corpo e a mente. No coração desse cosmo infinito, ele busca não apenas compreender, mas também se fundir com o mistério primordial — uma verdade cósmica que altera para sempre a noção de ser.
Gênero: ficção científica metafísica, ficção científica surrealista 

Leia também:
Parte I
Parte II

III

Tudo é escuro a ponto de não existir diferença entre estar de olhos fechados ou abertos. Não vejo o meu corpo. Permaneço imerso na escuridão por um tempo indefinido. Horas, dias. Anos? No silêncio absoluto, uma hora se parece como um dia, e um dia como uma década. Se adormeço durante minha estadia, não sonho. Toda a minha companhia é a escuridão, e não há como se acostumar ao silêncio e a ela. Me incomoda, quero ver vida outra vez.

Pingos de luz emergem no pretume que insiste em ofuscar, engolindo qualquer coisa que lhe pareça estranha. Noite e dia não existem e menos ainda passado ou futuro. Aos poucos, dou conta de que estou naquele mesmo lugar que outrora o meu espírito estivera, não em uma cabana, mas no entorno, no próprio mar negro. Sinto a velocidade do meu eu ao transitar rapidamente entre os pingos de luz.

Viajo pela luz e pelo líquido espesso e escuro, que não gruda. Teria caído no mar negro sem me dar conta? Não respiro, não sei se nado, se estou voando ou flutuando por tudo. Em meio a escuridão, não faz diferença alguma o lugar que estou. Avisto algo semelhante a um berçário marinho. O mar negro é profundo e estranho a tudo que me é conhecido. Há beleza no que temo, por isso facilmente me entrego.

mar negro é profundo e estranho 
a tudo que me é conhecido. Há beleza no que temo
Mar Negro

Poeira e gosma se fundem e se movimentam em torno de mim. Olho para baixo e não consigo ver o fim, nem um caminho para seguir. Estou paralisado, hipnotizado pelas sensações estranhas e pela beleza do desconhecido. Em um dado momento, percebi que não conseguia pisar em nada sólido. Permanecia em movimento, sem saber ao certo como me movia. Começo a suspeitar de que estou em órbita de alguma coisa.


Me sinto impotente, sem controle do que vem a seguir. O que posso fazer diante de tudo? Brigar, questionar? Mas com quem? Contra quem? Poderia pensar em escapar, mas como posso traçar planos de fuga para algo que não sei o que é? Não há o que fazer a não ser me entregar ao que quer que seja àquilo. O assustador é que tudo era relaxante e pedia passividade. Desliguei-me de mim e naveguei por aquele universo.

| foto: pixabay

Conforta a concepção humana de tudo que tem uma causa provoca algum efeito. Eu esperava entender o propósito em ter mergulhado nesse mar. Para cima, para baixo, desacelero. Tudo agora segue um ritmo mais lento e ameno. Tão mais calmo que noto o escuro ser preenchido por inúmeros pontos brancos brilhantes; entre eles, avisto uma bola azul gigante. Depois de tanto tempo no escuro, reconhecer outras cores me traz de volta à vida. Sou atraído por ela e acelero em rota de colisão. Sou um asteroide pronto para me chocar na esfera azul.

Um planeta? Que forma de vida incorporarei? Estaria pronto para encontrar aquele lugar outra vez? A possibilidade me anima. Caio em queda livre, mas sem dor. Sou um cometa viajante que percorreu anos-luz pelo cosmos e agora é engolido pelo azul de um planeta até chegar ao solo. Encontro com um eu novamente, mas desta vez este corpo não é o que conheço. Sou outra pessoa, mas me reconheço tal qual o ser terrestre que sou. Meus olhos escaneiam e tentam decifrar o que há de diferente ao meu redor. Avisto também algumas construções naturais, algo como colinas de areias e rochas alaranjadas. Em que parte do universo estou?

Leia também: Mar Negro - Parte IV

Comentários